quinta-feira, 29 de outubro de 2009

Os erros do governo Lula e do petismo

O PT é um partido socialista, tendo como base a filosofia marxista e a Teologia da Libertação. Entretanto o governo Lula não é socialista, e nem poderia ser, uma vez que a esquerda não possui hegemonia alguma sobre a sociedade, muito pelo contrário, basta observar que o maior partido do país é o PMDB, que possui a maior bancada no Congresso Nacional, e o maior número de governadores e prefeitos. Portanto seria impossível ao PT e seus aliados da esquerda(PSB, PDT, e PCdoB), querer estabelecer qualquer tipo de política socialista.

Mas todos esperavam que o governo Lula fosse social-democrata, representando um projeto de centro-esquerda. Mesmo não sendo uma social-democracia combativa, se esperava que promovesse reformas que beneficiassem os trabalhadores, como redução da jornada de trabalho para 40 horas semanais(sem redução de salário), reforma agrária, e o fim do fator previdenciário. Também se esperava que promovesse a reestatização da Cia Vale do Rio Doce e o restabelecimento do monopólio estatal do petroleo, resgatando assim a soberania nacional. E o principal, se esperava que combatesse a corrupção, e não que a promovesse(como acabou acontecendo com o "Mensalão"). Citando João Ubaldo Ribeiro: "Quem votou em Lula, notadamente da primeira vez, sabia, de modo geral, que não estava escolhendo um governante através de uma revolução, mas das instituições vigentes. Portanto, muitos desses, como eu, não esperavam milagres e rupturas estrondosas. Mas esperava-se pelo menos certa fidelidade ao prometido, apregoado e bravateado ao longo dos anos, esperava-se alguma luta para a eliminação de alguns dos nossos males, esperavam-se, sim, reformas, ainda que não de todo satisfatórias. Esperavase no governo, enfim, o PT que se conhecia, ou se julgava conhecer." (O fim do PT e a ascensão do lulismo; O Globo - 05/08/2007)

Lógico que o governo Lula não é neo-liberal, como vive afirmando de forma caluniosa a extrema-esquerda liderada pelo PSOL. Entretanto o governo Lula não está realizando um projeto democrático e popular, mas um projeto ao estilo da social democracia moderada(a chamada Terceira Via), que nem de longe sinaliza uma busca real pela construção de um caminho em direção a luta pela hegemonia da esquerda na sociedade, condição para uma revolução processual rumo ao socialismo com liberdade e democracia.

E mais, apesar do discurso contrário ao socialismo burocratico e totalitario de partido único, os petistas apoiam a ditadura castrista, que representa justamente esse socialismo burocratico e totalitario, que existia na antiga URSS e no Leste Europeu, e felizmente está soterrado sobre os escombros do Muro de Berlim. O PT e a esquerda socialista e democrática em nosso país, infelizmente confunde a defesa da Revolução Cubana com a defesa do castrismo.

Esses erros me afastaram definitivamente do PT. Apesar de ter saido do partido em 2000, continuei sendo simpatizante do PT, tanto que votei em Lula nas eleições presidenciais de 2002. O primeiro governo de Lula já começou a promover meu afastamento do petismo, ainda mais com o escandalo do "mensalão". Nas eleições presidenciais de 2006, votei em Cristovam Buarque para presidente, mas no segundo turno votei em Lula, para derrotar Geraldo Alckmin e o projeto neo-liberal de tucanos e pefelistas. Mas esse segundo governo do presidente Lula continuou insistindo nos erros, chegando ao extremo do absurdo ao defender o senador José Sarney, para garantir o apoio do PMDB a candidatura de Dilma Roussef.

Por isso sou oposição ao governo e em hipótese alguma voto em Dilma Roussef. Os petistas e a esquerda em geral, precisam fazer uma autocritica capaz de promover a ruptura com todos os erros que infelizmente insistem em continuar praticando, ou seja, achar que os fins justificam os meios.

Os desvios éticos do petismo tem suas origens na cultura bolchevique

Quando Lenin chegou a Rússia, após a "Revolução de Fevereiro" que havia derrubado o Czar Nicolau II e estabelecido o democrático e ineficiente governo provisório, ele só o fez porque havia feito um acordo com os alemães, que interessados em tirar a Rússia da Primeira Guerra Mundial, o forneceram um trem blindado para que atravessasse o território alemão e conseguise sair da Suiça, onde estava exilado, e chegar a Rússia. O Kaiser Guilherme II fez isso pois sabia que Lenin era contrário a guerra e caso chegasse ao poder, faria aquilo que os alemães queriam para assim concentrar suas tropas na guerra contra franceses, italianos, ingleses e americanos no front ocidental. E Lenin aceitou porque defendia a tese que afirma ser os fins, justificativa para os meios, portanto se os fins eram fazer a revolução socialista na Rússia, acendendo o estopim do que acreditava ser o começo de uma revolução socialista mundial, tudo bem fazer um acordo com o monarca da Alemanha imperialista e capitalista. Alias, essa mesma lógica fez Lenin promover o chamado "terror vermelho" durante a guerra civil que tomou conta da Rússia após a "Revolução de Outubro", pois se para manter o socialismo no poder fosse necessário matar civis inocentes, tudo bem promover uma política terrorista, que depois seria radicalizada por Josef Stalin(e depois ainda tem gente na esquerda que não percebe a culpa de Lenin no surgimento do stalinismo). Portanto está correto o filósofo marxista Ruy Fausto, quando diz: "Não que eu suponha uma simples continuidade entre bolchevismo e stalinismo. Mas afirmo sim que o totalitarismo stalinista é impensável sem o bolchevismo, e que há linhas reais de continuidade entre os dois". (Ruy Fausto; "Em Torno da Pré-História Intelectual do Totalitarismo Igualitarista")

Os petistas nunca defenderam o modelo de socialismo desenvolvido por Lenin, tanto que sempre garantiram o pleno direito de tendências permanentes se organizarem no interior do PT, não adotando o chamado "centralismo democrático", que nada tem de democrático, e é o princípio de organização existente em todos os partidos que se baseiam no bolchevismo(como é o caso do PSTU, PCB, e PCdoB). Os petistas inclusive nasceram criticando o autoritarismo existente no chamado "socialismo real", deixando bem claro que eram anti-stalinistas. Entretanto como é tradição na maior parte da esquerda, os petistas não criticavam Lenin e o bolchevismo, limitando-se a reconhecer que haviam erros nesse tipo de socialismo, assumindo parcialmente a critica de Rosa Luxemburgo a Lenin. Portanto nunca foram contrários ao bolchevismo, apenas não seguiam esse modelo, inclusive eram influenciados por ele. Mesmo não sendo integral essa influência, era existia e ainda existe, tanto que os petistas nunca condenaram as ditaduras do chamado "socialismo real", muito pelo contrário, tratando-as como equívocadas porém socialistas, e dessa forma "aliadas e amigas" do PT. Por isso até hoje defendem a ditadura castrista em Cuba.

E como são influenciados pelo bolchevismo, como diz Ruy Fausto, os petistas não abandonaram a tese de que os fins justificam os meios. Trocaram apenas a violência pela corrupção, e se esses fins significa manter o presidente Lula e o PT no poder, nada mais natural do que usar da corrupção para garantir uma base de apoio. Por isso o episódio do "Mensalão", e mais recentemente o apoio que os petistas deram ao Senador José Sarney(PMDB/AP), o que garantiu a permanência do mesmo na presidência do Senado, e em troca o apoio peemedebista a candidatura de Dilma Roussef.

Os socialistas e comunistas mais "ortodoxos" ficam embasbacados em ver como Lula, que antes condenava a direita clientelista e reacionária, agora tem nessa mesma direita sua base de sustentação. Lula é hoje aliado de José Sarney, Fernando Collor, e até mesmo dos malufistas do PP - Partido Progressista(herdeiros da ARENA). E esses "ortodoxos" criticam a corrupção no governo, dizendo que a bandeira "ética" da esquerda socialista foi traida. Ficam embasbacados por pura hipocrisia, pois sabem muito bem que Sarney, Collor e os malufistas são para Lula, aquilo que os alemães e o Kaiser Guilherme II foram para Lenin. E mais, qual ética possuia Lenin e os bolcheviques??? Em relação a eles, Lula e os petistas até que são extremamente éticos, pois o "Mensalão" é bem menos condenável do que o "terror vermelho", não acham???

Por isso eu volto a dizer: a esquerda precisa romper com todos os vínculos que ainda insiste em manter com a herança bolchevique. O primeiro passo é assumir integralmente a critica que Rosa Luxemburgo fazia ao bolchevismo, lembrando que o socialismo não pode ser sinonimo de totalitarismo, ditadura de partido único e coisas afins. Por isso é preciso ser contrário a ditadura castrista em Cuba, não confundindo a defesa da Revolução Cubana com esse regime que representa o último bastião do finado "socialismo real"(junto com a miserável Coréia do Norte e sua ditadura stalinista hereditaria).

Mesmo apoiando a "Revolução de Outubro", inclusive se solidarizando com os bolcheviques, Rosa Luxemburgo não teve uma visão acritica, beata e de sacristia sobre esse processo revolucionário, pelo contrário, mantendo sua critica ao autoritarismo bolchevique e no clássico "A Revolução Russa", escrito em 1918, alertou para as consequencias desse autoritarismo.

"A liberdade apenas para os partidários do governo, só para os membros de um partido - por numerosos que sejam - não é a liberdade. A liberdade é sempre, pelo menos, a liberdade do que pensa de outra forma (...). Sem eleições gerais, sem uma liberdade de imprensa e de reunião ilimitada, sem uma luta de opinião livre, a vida acaba em todas as instituições públicas, vegeta e a burocracia se torna o único elemento ativo. [...] Se estabelece assim uma ditadura, mas não a ditadura do proletariado: a ditadura de um punhado de chefes políticos, isto é uma ditadura no sentido burguês".

(Rosa Luxemburgo; em "A Revolução Russa")


Segundo o cientista social Michael Löwy, um dos mais importantes teóricos do marxismo na atualidade: "Constatando a impossibilidade, nas circunstâncias dramáticas da guerra civil e da intervenção estrangeira, de criar "como que por magia, a mais bela das democracias", Rosa não deixa de chamar a atenção para o perigo de um certo deslizamento autoritário e reafirma alguns princípios fundamentais da democracia revolucionária. É difícil não reconhecer o alcance profético desta advertência. Alguns anos mais tarde a burocracia apropriou-se da totalidade do poder, excluiu progressivamente os revolucionários de Outubro de 1917 - antes de, no correr dos anos 30, eliminá-los sem piedade." ( Michael Löwy; em "Rosa Luxemburgo: um comunismo para o século XXI")

Oras, se Rosa Luxemburgo foi profética pois percebeu nos graves erros do bolchevismo, a origem daquilo que viria ser a bestialidade stalinista, como a esquerda não enxerga que o bolchevismo precisa ser condenado, se hoje temos a experiência histórica para confirmar esse fato??? O stalinismo não é resultado de nenhuma "contra-revolução burocratica", mas resultado do próprio bolchevismo. O filósofo marxista italiano Pietro Ingrao, figura histórica do comunismo naquele país, condena os crimes de Lenin ao dizer: "Já Lenin afirmava a construção violenta do Estado e do poder político, e não se tratava só de uma resposta revolucionária ao sangue do capitalismo. Era uma idéia errada, erradíssima, de abuso e de esmagamento, que também atingiria, cedo ou tarde, uma parte do movimento operário" (Em depoimento dado a Antonio Galdo, intitulado "Il compagno disarmato"). E completa sua critica reconhecendo a culpa de Lenin no surgimento do stalinismo, ao dizer: "Antes nos iludíamos dizendo que havia uma diferença substancial entre os dois personagens centrais da história do comunismo e considerávamos Stalin o traidor dos ideais de Lenin. Não era verdade. Hoje, por sabermos a verdade, podemos captar melhor as diferenças entre Lenin e Stalin, a partir daquela que considero a mais significativa. Lenin, com sua revolução, teve em mente o poder dos sovietes e do partido, conquistado e defendido com a violência. Em vez disso, Stalin, com métodos ainda mais ferozes em relação a Lenin, tem em mente só o poder pessoal e do seu clã."(Em depoimento dado a Antonio Galdo, intitulado "Il compagno disarmato")

O historiador marxista Jacob Gorender também condena o bolchevismo, em seu livro "Marxismo sem utopia", mas a maior parte da esquerda insiste em não querer enxergar essa verdade, e isso inclui os petistas.

O segundo passo é assumir a defesa da democracia como valor universal, reconhecendo portanto a necessidade da ética no trato da coisa pública, não confundindo os interesses partidários com os interesses da sociedade.

O socialismo renovado precisa ser democrático e ecológico, fundado em uma ética humanista e libertária.

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